lunes, 19 de julio de 2010

A pesar de você- Chico Buarque


Oi pessoal!!!

Estive pensando: esse sistema de postagens, às vezes em português e outras em espanhol, não é bacana para apresentar textos e histórias, ou pelo menos não cumpre com a minha intenção de fazer uma ponte real entre as duas línguas. É por isso e para evitar que cada postagem fique eterna com versão original e tradução, resolvi criar este blog paralelo onde, con apenas um clique, vocês poderão conferir a tradução da postagem original.

Enfim, esse é simplesmente mais uma tentativa de organizar melhor essa nossa troca de informaçoes, tomara que dê certo!



Bom, vamos à postagem do dia?



Ganhei da minha amiga Angélica o livro
"Histórias de cançoes- Chico Buarque", de Wagner Homem, que narra as histórias de algumas das músicas do compositor carioca. Tem muitas anedotas e cançoes que vale a pena conhecer, mas para continuar com o meu jeitinho de trabalhar aqui, vou esperar até elas me encontrarem antes de postar aqui.

Hoje esbarrei com "A pesar de você", que achei uma das letras mais fortes e uma das histórias mais interessantes.

Durante a última ditadura brasileira, o Chico Buarque foi auto-exilado na Itália, pais onde havia passado dois anos na infância. Foi no ano 1970, que ele compôs a canção a seguir:

A pesar de você- A su pesar

Hoje você é quem manda Hoy es usted quien manda
Falou, tá falado Lo dijo, está dicho
Não tem discussão, não. No hay discusión, no.
A minha gente hoje anda Hoy mi gente anda
Falando de lado e olhando pro chão Hablando de costado y mirando al suelo
Viu? ¿Vió?

Você que inventou esse Estado Usted inventó este Estado
Inventou de inventar Inventó inventar
Toda escuridão Toda la oscuridad
Você que inventou o pecado Usted que inventó el pecado
Esqueceu-se de inventar o perdão Se olvidó de inventar el perdón

Apesar de você A su pesar
Amanhã há de ser outro dia Mañana será otro día
Eu pergunto a você onde vai se esconder Yo le pregunto ¿dónde se esconderá
Da enorme euforia? De la enorme euforia?
Como vai proibir ¿Cómo prohibirá
Quando o galo insistir em cantar? Cuando el gallo insista en cantar?
Água nova brotando Agua nueva brotando
E a gente se amando sem parar Y nosotros amándonos sin parar

Quando chegar o momento Cuando ese momento llegue
Esse meu sofrimento Este sufrimiento mío
Vou cobrar com juros, juro! Lo voy a cobrar con intereses, juro!
Todo esse amor reprimido Todo este amor reprimido
Esse grito contido Este grito contenido
Esse samba no escuro Este samba en el oscuro

Você que inventou a tristeza Usted que inventó la tristeza
Ora tenha a fineza Vamos, tenga la delicadeza
De desinventar De des-inventar
Você vai pagar, e é dobrado Usted me pagará, y el doble
Cada lágrima rolada Cada lágrima derramada
Nesse meu penar En éste mi penar

Apesar de você A su pesar
Amanhã há de ser outro dia Mañana será otro día
Ainda pago pra ver Todavía pago para ver
O jardim florescer El jardín florecer
Qual você não queria El que usted no quería

Você vai se amargar Usted se amargará
Vendo o dia raiar Viendo el día amanecer
Sem lhe pedir licença Sin pedirle permiso

E eu vou morrer de rir Y yo moriré de la risa
E esse dia há de vir Ese día llegará
Antes do que você pensa Antes de lo que usted piensa
Apesar de você A su pesar

Apesar de você A su pesar
Amanhã há de ser outro dia Mañana será otro día
Você vai ter que ver Usted tendrá que ver
A manhã renascer La mañana renacer
E esbanjar poesia Y derrochar poesía

Como vai se explicar ¿Cómo se explicará
Vendo o céu clarear, de repente Viendo el cielo clarear, de repente
Impunemente? Impunemente?
Como vai abafar ¿Cómo ahogará
Nosso coro a cantar Nuestro coro cantando
Na sua frente En su cara
Apesar de você A su pesar?

Apesar de você A su pesar
Amanhã há de ser outro dia Mañana será otro día
Você vai se dar mal A usted le irá pésimo

Naquela época, era quase impossível as composiçoes do Chico passarem pelo `pente fino´ da censura brasileira, ou no mínimo passarem sem modificaçoes. Aliás, ele estava tão certo da existência duma sorte de lista maldita, que compôs três músicas sob a identidade de Julinho da Adelaide, e constatou que o problema não eram as letras e o que dizia nelas senão que ele assinava como autor.

Quando acabou de compor "A pesar de você", mostrou a nova letra ao amigo Vinícius de Moraes e, prevendo possíveis atritos com a censura, foi consultar o produtor e também amigo Manuel Barenbein, quem disse que ele só poderia ter problemas se os censores percebessem segundas intençoes na letra. Intençoes que, no meu entender, são bastante óbvias, né?

Grande foi a surpresa geral quando a letra passou sem censuras nem modificaçoes e, uma vez gravada chegou vender além de 100 cópias numa semana só.

Tudo ia bem, até que uma matéria publicada num jornal carioca insinuou que o "Você" da letra, na verdade referia-se ao então presidente Médici. Óbviamente, o Chico já tinha um argumento pronto, caso alguém perguntasse, e cínicamente disse que a letra falava numa mulher muito mandona. Dessa vez a explicação não colou e a polícia recolheu as cópias das lojas, sequestrou e destruiu o estoque das fábricas, proibiu a execução nas rádios e ainda puniu o censor que deixou passar aquele desrespeito ao governo.

3 comentarios:

Angélica Vargas dijo...

Adoro essa música, assim como muitas outras (quase todas) do Chico.
Ele é quase que um artista completo, faz parte da História do Brasil, muitas de suas canções nos relatam os acontecimentos políticos ocorridos por aqui.
Esse livro é realmente muito interessante e gostoso de ler.
Encontrei no site do Chico esse texto que achei muito legal!



" Andando com Tom


Songbook de Tom Jobim, 4ª. edição, Ed. Lumiar, volume 1 - 1990

Eu era um garoto que, como os outros, amava a Bossa Nova e o Tom Jobim. Queria ser um compositor igual ao Tom Jobim. Não gostava mais das canções desesperadas. Só queria aquela música que era toda enxuta, porque derramada para dentro. Queria tocar piano igual ao Tom Jobim. Como nada me saísse direito, eu disse "este piano é uma droga" e fugi de casa. Queria contar histórias igual ao Tom Jobim.

Fui dar na casa de Tom Jobim em Ipanema. Aloysio de Oliveira me apresentou a ele e eu mostrei meu samba no violão. Tom olhou. Noutro dia, inventou um acorde para o meu samba, ficou repetindo o acorde dele e dizendo "você é um craque". Quando o Tom entra com um acorde dele, parece que abriram a janela.

Foi para Nova Iorque, gravou com Sinatra e o pessoal disse "poxa". Voltou porque sentiu saudade dos chatos. Se mudou para o Leblon, mas continuou no bar de Ipanema. Me deu parceria, um pouco para se vingar de Vinícius, que estava saindo muito com Baden e Edu. Nossa Sabiá foi vaiada no Maracanãzinho e ele chorou um pouquinho no túnel Rebouças.

Me telefonou de Londres para Roma, preocupado com a poluição do ar. Desligou 50 minutos depois. Me acordou de madrugada porque se lembrou que a poluição no ar também é coisa grave. Esteve comigo em Roma, mas não gostou da cerveja.

De volta ao Rio, passeamos bastante. Bebemos uísque no Antonio's, no Luna Bar, na sauna, no Canecão, depusemos juntos no Dops. Vi Águas de Março sendo rabiscada. Às vezes, acho que é o samba mais bonito do mundo.

Me deu dois dicionários de espanhol, um de inglês, me emprestou The wast land em italiano, me releu Drummond, me emprestou seu feiticeiro, me ensinou arquitetura. Gostava do meu pai. Me falou do seu pai e um dia me levou para a sua sessão de análise, mas isso foi muito antes. Me ajudou a comprar um piano e me explicou que eu não levo jeito para pianista."

Angélica Vargas dijo...

Adorei essa idéia do vice-versa!!!
Escrevi um comentário grande e não sei se foi enviado...
Vou aguardar!
besos

Lusiane dijo...

A Angel arrasou!!!

Bonita amizade desses dois! E o melhor de tudo... é que quem se deu melhor foi a gente!!! hahahah

Besos